Dia Internacional das Mulheres – Dignidade das Trabalhadoras Domésticas

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A Procuradora Regional do Trabalho da PRT11, Ana Lúcia Ribas Saccani Casarotto*, revela, neste artigo, aspectos legais que merecem destaque quando se trata dos direitos dos domésticos

Ainda que a reforma trabalhista aprovada e com vigência a partir de novembro do ano passado tenha retirado direitos consagrados no nosso ordenamento jurídico, ainda existem boas notícias, merecedoras de lembrança e comemoração no Dia Internacional da Mulher.

No final de janeiro deste ano, o Brasil ratificou a Convenção nº 189 da OIT sobre Direitos e Garantias das empregadas e dos empregados domésticos. Já não era sem tempo, pois temos cerca de 7 milhões de trabalhadores domésticos no país merecedores desses direitos e de tratamento mais decente. Vejo que a posição governamental nesse caso vem valorizar esses trabalhadores e aos poucos retirá-los da invisibilidade profissional, cultural, social e econômica.

A normativa internacional contém 27 artigos com disposições genéricas, que agora se tornam internalizadas ao nosso sistema legal, tendo natureza legal equiparada às normas constitucionais. A normativa vem a corroborar a importância da categoria, e consequentemente eleva o patamar da dignidade desses trabalhadores, que adentram no seio de nossos lares todos os dias.

Somente são consideradas domésticas as pessoas que laboram em regime de subordinação e para fins não comerciais, em prol dos cuidados quer com a casa, quer com aos seus moradores, quer somente com as crianças, idosos e demais pessoas que habitem sob um mesmo teto. Ainda que outras atividades possam ser enquadradas na natureza doméstica, como as funções de condução e transporte dos seus patrões, jardinagem, verifica-se que a maioria preponderante é formada por mulheres, exercendo as atividades típicas de cozinheiras, serviços de limpeza e arrumação, cuidadoras e babás.

Tal qual a nossa Constituição Federal fez em seu artigo 7º, XXX, no parágrafo único, desde o ano de 1988, e, posteriormente, a Emenda Constitucional de 2015, PEC das domésticas, resta indene de dúvidas que houve o empoderamento legal e a valorização desse ramo de atividades. Com isso também se percebe a política social de proteção às mulheres, porquanto é certo que prepondera o gênero feminino no trabalho doméstico.

Alguns aspectos legais merecem destaque quando se trata dos direitos dos domésticos, dentre eles podemos citar: a jornada laboral desses profissionais, que há de respeitar o limite diário e semanal, respectivamente em 8 horas e 44 horas. Grande avanço também ocorreu com a garantia indiscutível da licença maternidade, férias anuais remuneradas com o pagamento do adicional de um terço a mais do valor da remuneração mensal. Além desses direitos, deverá o empregador doméstico (patrão) recolher o FGTS, vale transporte, salário mínimo regional, folgas em domingos e feriados de 24 horas, adicional noturno. E uma das obrigações mais importantes: fazer a correta e devida anotação na CTPS, desde o início do contrato de trabalho, formalizando assim a relação empregatícia, as cláusulas contratuais e os direitos daí decorrentes, tais como os direitos trabalhistas, previdenciários: licenças gestante, maternidade e aposentadoria.

Dentre tantos direitos, porém, não podemos esquecer que aos empregados domésticos, cumpre observar as mesmas regras que os demais trabalhadores no que tange ao exercício subordinado das suas atividades, como o proceder honesto para angariar a confiança dos seus patrões sob pena de dispensa por justa causa, cujos motivos encontram-se elencados na Consolidação das Leis Trabalhistas.

É certo que as situações vivenciadas em uma casa são diversas e intensas, e no caso desses trabalhadores a fidúcia pode ser quebrada por um único comportamento ou, em casos de grave insubordinação, desrespeito aos patrões, desonestidade, não vejo imprescindível a adoção das medidas paulatinas e gradativas de outras penalidades, considerando que os fatos poderão culminar com a imediata dispensa por justo motivo.

Por sua vez, a privacidade, dignidade, honra, a intimidade desses profissionais deverá ser observada por todos os moradores da residência, sendo indene de dúvidas que devido à proximidade diária com os empregadores sujeitam-se mais frequentemente ao assédio moral e sexual no ambiente laboral.

É de grande importância informar que o trabalho dos domésticos de forma alguma poderá ser exercido por crianças e por adolescentes com idade inferior aos 18 anos. Neste aspecto a grande incidência de trabalho infantil repousa nas babás, que usualmente, como mostram as estatísticas, são meninas, pobres e pardas, com pouca idade para cuidar dos bebês ou das crianças. Neste aspecto, a sociedade possui relevante papel quando deixa de fomentar tais trabalhos e exerce seu direito de denúncia aos órgãos competentes do exercício de trabalho infantil em residências.

Em suma, merecedora de elogios a ratificação da Convenção Internacional nº 189 da OIT, a qual além de dignificar a profissão, elevou o Brasil ao patamar dos países desenvolvidos, respeitadores dos direitos humanos e do trabalho doméstico decente. Além do mais, com a internalização da normativa ao nosso regramento legal, esperamos que o país intensifique os programas federais, estaduais e municipais de combate à precariedade do trabalho doméstico, bem como intensifique as medidas de fiscalização ao trabalho infantil doméstico. Matéria tão cara aos nossos filhos e a nova geração, que merece ser educada e não explorada.

* Ana Lúcia Ribas Saccani Casarotto é Procuradora Regional do Trabalho - PRT 11ª Região.

Artigo originalmente publicado no Jornal Folha de Boa Vista (impresso) e Folha web no dia 17/03/2018.

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